Choveu como eu nunca tinha visto antes. O céu enegreceu num estalo, sinfonia única. A parede densa e molhada apontava para nossa direção. Roupas voavam do varal, árvores envergavam torturadas por gotas imensas e trovões, trovões iludiam o desabar do mundo... muito medo, um medo sórdido, catatônico, diferente, escorregadio de estranheza
Mudamos as coisas de um lugar para outro umas cem vezes, tudo encharcava ou molhava, sem jeito. Vivíamos um tempo insólito, não sabíamos há quanto tempo chovia, nem prevíamos quando pararia, se é que... a água evaporava indiferente a qualquer súplica, mantinha-se cíclica, impiedosa. Nuvens rebolando no céu em densos panos pretos acinzentados, talvez estivessem cansadas de serem nuvens simplesmente. Foi tudo tão rápido que durou uma eternidade; o rio, a transformação, a turgidez insolúvel das águas, a desilusão dos cantos perdidos... um mar de pernas pro ar... a única coisa que sabíamos era que devíamos segurar a estrutura da casa.
Na estiagem, a floresta assumiu um verde novo, reluzente, quase uma barbaridade. Os passarinhos cantavam assustados o milagre da vida. O canto de guerra, como se quisessem defender seus ninhos. Ninhos construídos pela paciência do operário que sai em busca de cada fiapinho, agregando-os um a um, em trabalho árduo, saborosamente sem fim, o trabalho em migalhas... Observávamos. Na ânsia de vê-lo terminar sua casa
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