ENXERGAVA TUDO PRETO, PONTILHADO COMO SE TIVESSE CAIDO EM UM APARELHO FORA DO AR, CHAPISCADO CALEIDOSCÓPIO NEGRO DE VERÃO. SENTADA NO BARCO CONTINUEI IMÓVEL DE CORPO, POR QUE A MENTE TINHA A VORAZ ÂNSIA DE ESCREVER QUALQUER COISA, QUALQUER LINHA ABSURDA, DESNUDA, AGUDA , FELPUDA, CASACUDA, LÍRICA, TESUDA, CARNUDA, DUVIDOSA, ASQUEROSA, SEI LÁ...

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Coreto de Piranga


Quilômetros de estrada e curvas perigosas. Dois desvios cheios de medo; o carro derraparia no menor movimento vacilante. Casinhas coloridas brotavam uma a uma numa rua de losangos empedrados. Sobe e desce de morros estreitos e famílias sentadas na soleira. Chegamos numa praça florescida por lírios, o despertar de seu lirismo; palmeiras imperiais, a fascinante supremacia, e pessoas dispersas em bancos bem colocados. Estendidas no umbral do presente. O coreto, no centro, tinha uma arquitetura delicada. Fora construído minusiosamente por mãos atentas à ciência ancestral, mãos que pincelaram ora a limpidez do branco, ora o ocre cor de carne, simbologia da relação da cor vermelha com o princípio ainda sobrevivente.
Pequenos pedaços de sons preenchiam os espaços vazios e pensamentos distraídos. As notas vinham distantes, de bumbos, cuícas, tambores e chocalhos - veludo para os ouvidos. A inusitada música caminhava, chegando de várias direções. Desciam crianças tocadoras de todas as ruazinhas estreitas direto para a praça central. A fabulosa banda de carnaval era a gêneses do novo. O mais velho integrante, o mestre de bateria, tinha uns quinze anos, talvez menos. Reciclavam marchinhas de Adoniran, Ari Barroso, Chiquinha Gonzaga...
O coreto celeste milagrosamente abria caminho "Ó ABRE ALAS QUE EU QUERO PASSAR..." as pessoas eram tocadas pela música e sorrisos orquestrados no ar feito estrelas iluminando o crepúsculo, as crianças vinham como anjos trazendo na harmonia a felicidade da cidade pintalgada de corações acesos.


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