ENXERGAVA TUDO PRETO, PONTILHADO COMO SE TIVESSE CAIDO EM UM APARELHO FORA DO AR, CHAPISCADO CALEIDOSCÓPIO NEGRO DE VERÃO. SENTADA NO BARCO CONTINUEI IMÓVEL DE CORPO, POR QUE A MENTE TINHA A VORAZ ÂNSIA DE ESCREVER QUALQUER COISA, QUALQUER LINHA ABSURDA, DESNUDA, AGUDA , FELPUDA, CASACUDA, LÍRICA, TESUDA, CARNUDA, DUVIDOSA, ASQUEROSA, SEI LÁ...

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

velha luta da cidade

muito cansada... entrou no ônibus arrastada por brisa mórbida e sutil. Algo de lento acontecia com seu metabolismo. Era a síndrome do dia-a-dia, hora-após-hora, corre-corre-desenfreado-dasruas; tudo junto num mesmo vendaval de robóticos homens. Ela girou a catraca cheia de esperanças de chegar
O ônibus lotadíssimo. Pessoas grudentas, mareadas. Vai e vem de corpos involuntários. Ao ultrapassar barreiras intransponíveis de carne fresca, subitamente estava diante de uma miragem, verdadeiro oásis iluminado pela amarelada luz de ônibus. Dois acentos brotaram à sua frente nitidamente sky blue. Glória! Ela desconfiou. Olhou de sombrancelhas arqueadas para todos em volta, por quê? Por que isso aconteceria justo com ela? Ela, que as coisas demoram tanto para acontecer? Nunca teve sorte em nada, nunca ganhou um brinde de dia das crianças na escola, nem sequer um bingo ou biribinha na casa da avó.

Mas é hoje!!! Hoje era seu dia, fora sorteada na roleta da vida. Os bancos eram dela, quis deitar, gritar, espernear, jogar-se desesperada de desejo, vontade, necessidade. Mas não, calma! você só precisa manter a calma garotinha. Não perca de vista a efemeridade das coisas. Sentou-se grosseiramente e pôde continuar a viagem na maior tranquilidade. As pernas enrijecidas pela fadiga agradeceram e foram sorridentes até em casa para amanhã sonhar novamente vencer alguma coisa.

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