O animal, cujo homem dos anos setenta mais estimava, era um ganso chamado Camilo, e não os jacarés. Certa vez, perguntei por que o nome Camilo; Ian disse que teve certeza de ser uma gansa: Camila. Anos de convivência depois, um amigo integrado na sexologia dos gansos foi capaz de libertar o animal de viver num cataclismo: a dupla personalidade devido à crise de identidade sexual. Mesmo depois de saber o sexo do bichano, continuei a achá-lo assexuado, porque ele nunca se interessava por nenhuma fêmea, o coração meio apagado, alheio ao alvoroço de todas.
Na realidade, Camilo e Ian formavam uma dupla inseparável; passeavam juntos, comiam, andavam de bicicleta, conversavam ao pôr-do-sol, na rua, praia... Ah! Tudo que se faz com um parceiro. O repentino amor – o acima! Um relacionamento invejável, como se tivessem nascido um para o outro. O ganso para o homem e o homem para o ganso. Quem sabe se de repente continuasse a ser Camila tudo seria diferente; provável, não combinariam.
Foi uma fase alegre de minha vida. Todo o fim de semana estava lá, no caixa, era bem tratada e me divertia. Uma maravilha! Até Camilo participava do forró, o bichano já era popular, sentava direto com a gente no bar. Sim, o ganso sentava no banco e só faltava alçar a voz. Em dias em que estava meio alta, chegava a imaginá-lo sofrendo metamorfose, permutando-se a uma figura antropomorfa “o ganso de fraque e charuto”. Havia torrentes de risos quando alguém virava para o ganso e dizia “Fala ai meu irmão!”. Acho que um desejo inconfesso e consensual era que Camilo falasse.
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