ENXERGAVA TUDO PRETO, PONTILHADO COMO SE TIVESSE CAIDO EM UM APARELHO FORA DO AR, CHAPISCADO CALEIDOSCÓPIO NEGRO DE VERÃO. SENTADA NO BARCO CONTINUEI IMÓVEL DE CORPO, POR QUE A MENTE TINHA A VORAZ ÂNSIA DE ESCREVER QUALQUER COISA, QUALQUER LINHA ABSURDA, DESNUDA, AGUDA , FELPUDA, CASACUDA, LÍRICA, TESUDA, CARNUDA, DUVIDOSA, ASQUEROSA, SEI LÁ...

domingo, 20 de fevereiro de 2011

a lenda do prédio verde-meleca. Porque o E.T não morreu!


Boa noite, telespectadores!

São 00:10.
Estamos aqui na rodoviária de Conselheiro Lafaiete, cidadezinha do interior de Minas Gerais. Daqui podemos ver em primeiro plano, o prédio mais famoso da cidade.
Há muitos anos atrás, conta a lenda, que esse prédio fora abduzido por extraterrestres não identificados. O prédio de treze andares sumiu inexplicavelmente por algumas horas. Pesquisadores de diferentes áreas e ufólogos do mundo inteiro tentaram decifrar o mistério, mas até hoje, nada foi descoberto.
A lenda do prédio verde-meleca perpetuou-se devido a marca deixada pelos visitantes do espaço. Uma linha de plasma intergalático, verde-meleca, corta o prédio inteiro do chão até a superfície. Realmente um fenomeno bizarro que atrai turistas do mundo inteiro.
(música do arquivo X para fechar a matéria)

Entrevista com o síndico do prédio (em vídeo no youtube):

Revista Plutão Para Sempre
O Senhor já notou alguma coisa estranha no prédio?

Síndico que não quis se identificar

Uma vez um garoto quebrou toda a portaria com um martelo. Estava muito nervoso.

RPPS

Isso teve alguma coisa a ver com o prédio ter sido abduzido?

Síndico que não quis se identificar
Quando aconteceu, todo mundo ficou com muito medo, medo mesmo. As pessoas do prédio achavam que tinha alguma coisa sim. Porque quase todo mundo já morava quando o prédio foi levado pro outro planeta, mas ninguém sentiu nada. Aí, na outra noite, a listra verde-meleca já estava no prédio, assim de repente, do nada, como mágica de mágico... e o menino; depois a gente soube que não foi nada disso não.

RPPS
Descobriram o que foi?

Síndico que não quis se identificar
Sim.

RPPS

O que?

Síndico que não quis se identificar

Não sei se pode falar aqui não.


RPPS

Pode sim, materemos total sigilo tanto para o senhor como para o menino.


Síndico que não quis se identificar
Ah sim! Ele acordou de noite com muita vontade de ir no banheiro. Quando entrou no banheiro, que estava escuro, sua avó já estava fazendo as coisas lá, sabe? O menino ficou doido, garrou o martelo e desceu de cueca mesmo. Ele quebrou umas coisas da portaria, já que o porteiro ficava trancado no quartinho dele de madrugada. O porteiro, Zé, tem um namorinho com a Dona Terezinha, mas ninguém pode saber, porque ela é casada com Seu Tomás... mesmo assim todo mundo já sabe. Ela é muito boa com Zé, leva almoço todo dia, docinhos, um monte de mimos...

RPPS
Obrigada Senhor síndico, o senhor ajudou muito mesmo. (o repórter foi embora perplexo e cheio de histórias para contar)


sábado, 19 de fevereiro de 2011

chá de Alice



olhar distante procurando uma coisa que não reconheciamos, tentava me comunicar falando alto, cutucando os braços, fazendo firulas, movimentos bruscos... mas os olhos não eram ele; o corpo de faquir, a pele ressequida, olhos sem brilho, apáticos, buscando brilho em um canto suspenso do quarto

segui a direção de sua visão quase infantil, não era nada, para mim, apenas um teto contornado por um cano verde de oxigênio e outro amarelo de ar comprimido, e mesmo assim parecia haver alguma coisa

imaginei que aquilo que tanto o entretia não vivia no canto suspenso do quarto, era coisa do de dentro; mergulho profundo no oceano de si mesmo, lugares antes nunca visitados, ignorados pela correria do dia-a-dia imperador, o tempo engolidor de corpos

labiríntico, o agora se faz agora

o marasmo medroso de reconhecer a criatura moradora daquela Casa que é sua... onde foi que perdeu o referencial de si mesmo? será que um dia soube por poucos segundos o que realmente foi? e pra quê?

a respiração ofegante inchando o peito pontiagudo por ossos cansados de tentar, o pulmão angustiado de saber que essa luta não é mais dele.... mas existe o outro, aquele que sofre, o carcereiro que deseja a permanência; a consciência então clama por ações do ator peregrino em terra árida, deserto imenso, monólogo sem pláteia

os aparelhos representam um humano demasiadamente humano, alheio à vã filosofia da vida, que se esvaindo assume proporções, conformações semelhantes para todas as criaturas do mundo... deixam de existir características singulares, quebram-se os paradigmas, há transgressão das regras e leis, uma nova perspectiva dos valores; todos somos um

sensação de formigamento, coceira como se milhões de insetos invisíveis caminhassem sobre a pele impunemente, a boca sempre aberta denunciando a respiração quase desesperada, não fosse o ritmo lento e desregrado

da janela, palmeiras imperiais gigantescas, robustas, agrediam com sua imponência de viver; sentia-me cada vez menor menor menor menorzinha
ínfima... achei ter bebido o líquido denso de Alice

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

olhar da lavoura arcaica


no jardim, as jasmins-manga exalavam um cheiro da infância que vivemos naquela casa. A festa reunia a todos; vizinhos, criados, primos distantes. A ciranda rodava para os dois lados, as pessoas não ficariam tontas com essa ciência milenar. Os músicos empolgados tocavam acordes embalados pelo corpo dançarino aquecido pelo instrumento. As mais velhas chegavam com travessas gigantescas, ostentando pratos coloridos dosados pelos mistérios de caldeirões enfumaçados, que os homens jamais poderiam chegar perto enquanto seu preparo. O patriarca sentava-se numa cadeira de vime real, estava sempre ereto e imponente, como se o tempo lhe pertencesse e nada pudesse lhe fazer de mal.
Ela rebentava no meio da roda de gente como fosse uma rosa que nasce da pedra, todos ficavam enlouquecidos com seu sopro de vida. Serpenteada e multiforme. Esfinge esperando ser decifrada, galgando nos passos da dança seu enorme misticismo... e eu, pés descalços, sentado a um canto, olhar arredio, roupas rotas e cabelos desdenhados, e eu... nada