olhei para o muro e vi a ponta de brasa acesa, foguinho cortado em v pela areca bambu, a imponência da palmeira e o mato do terreno baldio de trás atrapalhavam a visão. Mas tinha alguém, tenho certeza! como naquele dia em que lavava o carro de calcinha e camiseta
...talvez quisesse ser vista, tive uma sensação tão real que cheguei a sentir o toque, o toque de olhos estremecidos. A camiseta branca encarava feroz os convulsivos e orbitais olhos.
No chuveiro não, estavam calmos e calculistas, ostentavam até um cigarro como prova do poder que exerciam sobre mim. Sobre o corpo já sem os seios dourados.
Os olhos tudo vêem!
Um vulto, êxtase, estupor.
Perco a definição de mim mesma, a língua afaga os lábios superiores, a pupila dilata prenúncio da dúvida, será que estão lá? o cigarro? a respiração ofegante? os olhos vidrados? a sombra das folhas dançando na parede branca e o vento ameno, quase maternal, se não fosse pela dúvida. está lá? não posso olhar diretamente, se perceber vai embora, juro que vai, eu iria no lugar dele.
Ela queria, ela precisava. Resolveu tomar banho no quintal por raiva masoquista. O fluxo de água impiedoso congelava cada músculo inerte e esquecido pelo tempo. A Lua cheia inteira para ela, só para ela, que contemplava a luxúria de ser mulher e por isso poder gozar com a lua. O ritual representava o chamamento do amor... passou a acender velas, climatizar o ambiente, dia após dia, tudo para a deusa Lua. Vênus, banho encantado, o ritual.
E os olhos a esperavam cheios de desejo, vontade, necessidade...
Tinha certeza agora... depois do processo.
"Isso é rídiculo! Como aquela vaca pôde me processar se um tarado ficava me olhando tomar banho no quintal?" disse ao cara do fórum.
O julgamento seria daqui a uma semana.
Intimação extremante formal. Lá, estariam a promotoria, defesa e duas testemunhas, mas daonde? quem eram os cretinos? numa salinha 2 por 2 cheia de canalhas e canalhices. Que chacota, meu deus! ter que confessar que tomava banho pelada no quintal e sabia que o tarado do vizinho ficava olhando, oh! nossaaaa! isso vai é
Bando de imbecíl, será que uma mulher sozinha não pode se sentir desejada por ela mesma e resolver fazer sexo tântrico com a Lua no quintal? Isso não é pedir muito, não é!? Pedir muito é querer um homem para tirar o lixo para mim, conversar com o faz-tudo, eletricista, gerente de banco, contas, limpar o ralo, a caixa de gordura, abrir compota... isso sim me faria rir vertiginosamente. Ah, que maravilha! Mas eu me basto. OUVIU BEM SUA CORNA MANSA?...mesquinha... vai passar a maior vergonha só para tentar mexer no meu bolso, é uma filha da puta!
Queria ver se fosse você, ter que tirar aquele lixo enorme mal embalado num saco vagabundo, cheio de chorume, uma nojeira. E as unhas incrustadas por uma sujeita preta indomável.
Aqueles olhos eram meus, eles me pertenciam, vinham de qualquer lugar, não sabia daonde; mesmo sabendo, mesmo podendo acusá-los, castigá-los, eu os amava, nunca o faria.
na sensual lavada de carro... foi um máximo! os quadris embalados por música hilstiana, em transe, sem dúvida... a camisetinha, a calcinha biquíni, porque era biquíni, mas parecia muito uma calcinha porque de pano. Alongamentos apaixonados mostavam as pernas torneadas de uma vida.
ah! não vou não. Poderia me apaixonar pela haste da palmeira que implacável me masturbaria sem perguntar por que, amor é isso, é lavar o carro de calcinha para alguém, se perder de tesão no quintal tomando banho na lua cheia, é querer fazer um ritual do amor, não fazer e depois feito mágica descobrir que já o fez sem desconfiar como, simplemente o fez, o melhor.
...amanhã vou voar para Los Angeles de rolls royce pratiado.